O Sesc Paraná convidou escritores para compartilhar as suas leituras afetivas, obras que influenciaram a sua paixão pela literatura e até mesmo a sua produção literária.
O escritor Carlos Machado é quem inaugura esse novo espaço de partilha literária. Autor dos livros Olhos de sal (2020) – finalista do Prêmio Guarulhos de Literatura -, Era o vento (2019), Esquina da minha rua (2018), Poeira fria (2012), entre outros, Machado é um dos nomes mais importantes e interessantes da literatura produzida no Paraná, explorando temas como o não-lugar, a solidão e a relação da cidade com o sujeito.
Leia abaixo as cinco indicações literárias de Carlos Machado
Como é absolutamente impossível definir uma lista de livros que seja definitiva, apresento, na ordem em que os livros apareceram para mim, um pequeno caminho dos mais importantes para o leitor que sou e, consequentemente, para o escritor que desejo ser.
Carlos Machado (Curitiba, 2020)
Trapo – Cristovão Tezza
O livro tornou-se um de meus maiores exemplos do que poderia ser a literatura para mim. Um personagem com quem me identificava na época da primeira leitura, morando em um lugar parecido com o meu, coincidentemente em uma cidade também chamada Curitiba, com amores inventados e sempre flanando por ruas e pelas peripécias psicológicas de uma mente inquieta. Pronto, estava feita a mágica que me levava dos livros da maravilhosa coleção vagalume (sobretudo de Marcos Rey) para um outro universo…
Em busca de Curitiba perdida – Dalton Trevisan
Bastou atravessar a rua Ubaldino do Amaral para descobrir que essa cidade em que eu e o Trapo morávamos (cada qual em uma parte diferente dela mesma) era, na verdade, povoada por outros personagens, da mesma forma, sem prumo. Enquanto procuram sua(s) cidade(s) perdida(s), esquecem-se em amores brutais, paixões vitais e uma linguagem que mais parece uma facada no coração a cada vírgula. Dalton Trevisan tornou-se meu maior clichê. O meu escritor-fetiche.
Dom Casmurro – Machado de Assis
Uma pausa para o ciúme. Talvez a história de amor mais realista de nossa literatura clássica. Fica bastante evidente que Machado de Assis experimenta a realidade nesse texto. Uma relação de amor e ciúmes, paixão e desprezo. Uma visão unilateral da história entre homem e uma mulher. A crueza das situações cotidianas e as dúvidas suscitadas a cada novo encontro e conversa entre os personagens. O autor, mestre em nos apresentar as nuanças da vida, em seu melhor momento. Definitivamente o maior de nossos livros.
Noturno Indiano – Antonio Tabucchi
Assim me vi perdido em um não-lugar, em um espaço impossível, acompanhando a busca de um personagem por outro e que, no final de tudo, era nada mais, nada menos do que a minha própria procura por alguém que mal se sabe o nome. Uma mistura de Índia (suas cores, gostos e cheiros), Portugal (lágrimas, sal e Fernando Pessoa) e Itália (o Italiano é quem eu sou, diria Tabucchi) que já me abriu os olhos para a literatura universal, sem nacionalidade, sem um único idioma e que, portanto, nos permitia (e permite, naturalmente) a liberdade extrema.
As Cidades invisíveis – Italo Calvino
D’una città non godi le sette o settantasette meraviglie, ma la risposta che dà a una tua domanda. Assim afirma o grande Marco Polo, personagem de Italo Calvino nessa geometria literária que definiu o que para mim seria a maior obsessão como leitor e, portanto, como escritor: a presença ou a ausência do não-lugar. A presença de uma possibilidade de cidade dentro dos personagens, suas buscas pelo caminho e não necessariamente pelo fim. Com essa obra, Calvino me ajudou a definir de uma vez por todas o que seria meu projeto de vida. Salve a literatura.
Sobre Carlos Machado
Carlos Machado nasceu em Curitiba (PR), em 1977. É escritor, professor, cantor e compositor. Publicou os livros A Voz do outro (contos, 2004, 7Letras), Nós da província: diálogo com o carbono (contos, 2005, 7Letras), Balada de uma retina sul-americana (novela, 2006, 7Letras), Poeira fria (novela, 2012, Arte & Letra), Passeios (contos, 2016, 7Letras), Esquina da minha rua (novela, 2018, 7Letras), Era o vento (contos, 2019), Olhos de sal (novela, 2020, 7Letras). Integrou a banda Sad Theory, participando dos discos The Lady and the torch (2002), A Madrigal of sorrow (2004), biomechanical (2006) e Descrítica patológica (2012). Em carreira solo lançou Tendéu (2008), Samba portátil (2010), Longe (2012), Los Amores de paso (2013), Bárbara (2015) e DESencontro (2017).