O escritor Marcelo Maluf compartilhou com o Sesc Paraná as suas leituras afetivas, aqueles livros que ajudaram a moldá-lo como leitor e, claro, como autor.
Leia abaixo as cinco indicações literárias de Marcelo Maluf
Os cinco livros escolhidos aqui me formaram e me formam como leitor. Foram lidos em diferentes épocas da minha vida. E claro, se me deram a paixão pela literatura, também me formaram como escritor, já que para ser escritor é necessário primeiro ser leitor. Muitos livros ficaram de fora. O exercício da síntese dessas leituras afetivas em cinco, não foi nada fácil. Destaco aqui aqueles que ainda moram em mim de alguma maneira.
Para gostar de ler – Volume 3 – Crônicas – Vários autores
A coleção toda é ótima, mas esse volume em especial foi meu livro de cabeceira durante toda minha adolescência. Foi ali que me encontrei com Fernando Sabino, Paulo Mendes Campos, Rubem Braga e Carlos Drummond de Andrade. Primeiro conheci a prosa do Drummond, só depois a poesia. A leitura dessas crônicas até hoje me povoa. Sempre recorro a esse livro quando começo a me entediar com a literatura. Para me lembrar o motivo pelo qual eu decidi ser escritor. Ali, tudo é prazer, graça, beleza e sentido. E para completar ainda trazia uma entrevista com os autores falando a respeito dos seus processos de criação, entre outras coisas.
O Pirotécnico Zacarias – Murilo Rubião.
Foi na juventude que descobri Murilo Rubião. Um dos maiores contistas em língua portuguesa, em minha opinião. Mas o que me encantou na leitura dos seus contos sempre foi a capacidade de fabulação e de um fantástico que é único na história da nossa literatura e da literatura latino-americana. Me lembro do meu encantamento com o conto Teleco, o coelhinho. E também vale lembrar, ainda, que bem antes do boom latino-americano do Realismo Mágico que ocorreu entre os anos de 1960 e 1970, com Garcia Márquez, Cortázar, entre outros, Murilo havia criado o seu universo fantástico com a publicação do Ex-mágico, em 1947, seu primeiro livro. Mas meu objetivo aqui é dizer que Rubião me deu o prazer da leitura, a revelação e a possibilidade de reler e reescrever o mundo à luz do imaginário fantástico. Abriu o meu caminho para a descoberta de outros autores, como: José J. Veiga, Kafka, Calvino, Juan Rulfo, Maupassant, Leopoldo Lugones, entre tantos outros. Deixo aqui, registrado, a minha reverência ao mestre que enxergava o invisível no mundo visível.
Léxico Familiar – Natalia Ginzburg
O principal motivo pelo qual inseri esse romance de Natalia na lista é pelo modo como a memória se desenrola na narrativa, com uma sinceridade econômica e crua, mas que se dá não necessariamente pela lembrança dos eventos duros daqueles anos de guerra e de fascismo, mas acontece nas relações, nos detalhes, nos olhares, gestos, palavras e frases ditas pelos personagens. Natalia faz o micro prevalecer ao macro e por isso nos dá um testemunho inquieto, íntimo e verdadeiro. E tudo isso com muita simplicidade, sem grandes revoluções, mas com uma beleza sutil que nos acompanha, continua nos acompanhar por muito tempo depois do término do livro.
A Rosa do povo – Carlos Drummond de Andrade
Minha relação com esse livro é memorial. Lembro-me de ficar lendo os poemas em voz alta, repeti-los ao espelho. Lia e relia dezenas de vezes. Chegava a gravar em fita cassete a leitura com música ao fundo, sozinho em meu quarto, curtindo cada verso. O fato é que minha formação como leitor de poesia se dá verdadeiramente com Drummond, em especial com A rosa do Povo.
Laços de família – Clarice Lispector
Primeiro li os contos de Clarice, muito tempo depois fui ler os romances. Não sei se posso afirmar, mas acredito gostar mais da Clarice contista do que da romancista. E foi com a leitura de Laços de Família que adentrei o universo das histórias extasiantes, existenciais e tão imagéticas, plásticas, musicais que me atordoaram. Os contos “O amor”, “Uma galinha”, “Feliz aniversário”, “A menor mulher do mundo”, estão entre os meus preferidos do livro. Cada um deles uma aula de como escrever um conto.
Sobre Marcelo Maluf
Nasceu em Santa Bárbara D’Oeste, interior do estado de São Paulo, em 1974. Autor dos infanto-juvenis Jorge do pântano que fica logo ali (FTD, 2008), As mil e uma histórias de Manuela (Autêntica, 2013), entre outros. Seu primeiro romance A imensidão íntima dos carneiros (Reformatório, 2015), foi finalista do Prêmio Jabuti (2016) e vencedor do Prêmio São Paulo de Literatura (2016).